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Poema e Poesia de António Nobre

O Primeiro Homem 

Que lindo mundo! E eu só! Que tortura tamanha! 
Ninguem! Meu pae é o céu. Minha mãe é a montanha. 

A Montanha 

Os meus cabellos são os pinheiraes sombrios 
E veias do meu corpo os azulados rios. 

Os Rios 

Nós somos o suor que o Estio asperge e sua, 
Nós somos, em Janeiro, a agoa-benta da Lua! 

A Lua 

Eu sou a bala, no Ar detida, d'essa guerra 
Que teve contra Deus, em seu principio, a Terra... 

A Terra 

E eu uma das maçãs, entre outras a primeira, 
Que certo Virgem viu cair d'uma macieira! 

A Macieira 

Tantas ainda por cair! Vinde colhel-as! 
Abanae a macieira e cairão estrellas! 

A Estrellas 

No mar, á noite, reflectimo-nos, a olhar, 
E formamos, assim, as Estrellas-do-mar... 

O Mar 

Sou padre. São d'agoa meus Santos-Evangelhos: 
Accendei meu altar, relampagos vermelhos! 

Os Relampagos 

Nós somos (o contrario, embora, seja escripto) 
Os fogos-tátuos d'esta cova do Infinito... 

O Infinito 

Sou o mar sem borrasca, onde emfim se descança. 
Aqui, vem desagoar o rio da Esperança... 

A Esperança 

Morri, irmãos! mas lá ficaram minhas vestes, 
No vosso mundo: dei-as dadas aos cyprestes. 

Os Cyprestes 

Para apontar os céus, como dedos funereos, 
Plantaram-nos no pó dos mudos cemiterios... 

Os Cemiterios 

Porão, beliches, tudo cheio!... Os céus absortos! 
Não cabe em Josaphat esta leva de mortos! 

Os Mortos 

Seculos tombam uns sobre outros, como blocos, 
E nós dormindo sempre, eternos dorminhocos! 

António Nobre, in 'Só'

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