Raízes - António Tiza

O Monge Errante
Excerto
2021-03-12 08:06:58
Chamou o criado para que acomodasse as mulas no estábulo. Na verdade, o que interessava naquele momento era mesmo a ceia, preparada que estava pela desenvolva e robusta criada Juventina, mulher de formas apetecíveis para qualquer um, ainda que fosse clérigo.
Rompendo as regras de São Bernardo, saborearam o fausto repasto, bem regado com o vinho do vale do rio Igrejas e bem animado na conversa. Pensando bem, a comida e o convívio nunca foram declarados como pecado; o próprio Jesus Cristo comeu, bebeu e pregou, com recurso, naturalmente, à palavra; ele mesmo foi designado nas Escrituras com Verbum Dei.
Não havendo tempo a perder, os clérigos madrugaram, coisa a que estavam acostumados e, portanto, pouco lhes custou. Os louvados e os foreiros já os aguardavam no sobrado interior do passal. Logo se encaminharam para os terrenos que tinham de inquirir. Começaram a demarcação por um casal que pagava de renda anual catorze alqueires meados de cereal; era constituído por uma terra de três alqueires de semeadura e confinava com o adro da igreja matriz de São Miguel, com um terreno do concelho e com terrenos dos herdeiros de Augusto Chemeno; à entrada, havia uma casa de piso térreo e telhado de colmo, para moradia do foreiro e sua família. Este aguardava os delegados do mosteiro à porta de casa.
Perguntou o prior aos louvados se tinham confirmado recentemente a área do casal, assim como todos os bens que o constituíam.
– Reverendo padre, – respondeu o chefe dos louvados – tudo se encontra em conformidade. O terreno, com todos os seus tipos de cultura, a casa e as quadras para os animais. Tenho somente a observar o estado muito degradado do colmo da cobertura.
– Confirmais isto, foreiro Alcides? – Inquiriu o prior.
– Confirmo, reverendíssimo...
– E por que razão não o ajeitaste? Por acaso não colhestes centeio com palha de qualidade?
– Não é esse o caso. Eu não sei fazer esse trabalho de maneira a que possa estar seguro de que a coberta não mete água. E não tenho posses para encarregar alguém que o faça. É que a renda...
– A renda é alta para este casal, quereis dizer?
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